sexta-feira, 22 de outubro de 2004

Lapso de uma falta perene

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Hoje eu quis muito um colo
Um colo isento, quieto, calado
Que nada de mim esperasse, que em nada de mim dependesse
Não me tivesse como um peso, nem como uma esperança
Não me tivesse como uma previdência, uma poupança
Um colo singelo, que não me julgasse magro ou gordo
Um colo que não emitisse recibos, nem me enviasse contra-cheques
Que não me tivesse como ídolo, como exemplo bom ou mau
Quis apenas um colo, pra desabar meu cansaço, derramar minhas lástimas, ficar calado ao pensar, encostar e tentar parar
Que não me quisesse de bom humor, um colo assexuado, parado, sem cobranças, sem receios
Que me entendesse, minhas falhas, minha miséria
Que não me pedisse equilíbrio, deixasse-me em paz ali
Não tentasse me culpar ou absolver, apenas me aceitasse como alguém que precisa de colo
Um colo como pano de fundo pra minha dor, minhas reflexões, confusões, desesperos

Foi tudo o que eu quis, este colo
E tentei em vão dar colo pra mim,
E cansei, e chorei, e só, restei-me aqui.